Indignação das ruas contra corrupção tem que continuar, diz Transparência

Para ONG, há risco de desmobilização após fim do processo de impeachment
Para ONG, há risco de desmobilização após fim do processo de impeachment

Independente do resultado do processo de impeachment contra Rousseff, a população brasileira precisa manter “sua indignação” para que o combate à corrupção avance e evitar retrocessos no Brasil.

Essa é a avaliação da ONG Transparência Internacional, com sede em Berlim, especializada no combate à corrupção, que vê risco de desmobilização após um eventual afastamento da presidente.

“Se a indignação contra a corrupção levou a população às ruas, essa indignação tem que continuar. Agora é o momento de provar as coerências dessas motivações. É o momento de buscar mudanças reais no quadro político do país, mas também no nosso marco legal e nos nossos sistemas político e judiciário”, afirma Bruno Brandão, representante da organização para o Brasil.

A ONG vê com ressalvas a possibilidade de um governo comandado pelo PMDB, partido que acredita não ter histórico de combate à corrupção e que está envolvido no esquema de propinas e desvios desvendado pela Operação Lava Jato.

Para Brandão, seja qual for o veredito final dos senadores sobre o processo de impeachment, o importante é garantir a continuidade do combate à corrupção e que a Lava Jato não perca terreno.

“Vimos isso acontecer na Itália, com a Operação Mãos Limpas. A população acompanhou com muito afinco o processo de investigação e julgamentos no início, mas ela foi paulatinamente perdendo o interesse, o que enfraqueceu a operação e seu peso político”, diz.

A Mãos Limpas, vista como uma inspiração para a Lava Jato, desmantelou esquemas que envolviam o pagamento de propina por empresas para garantir contratos públicos e o desvio de recursos para financiar campanhas políticas na Itália da década de 1990.

Na época, foram investigados seis ex-primeiros-ministros e quase 500 parlamentares. Apesar de ter provocado grandes mudanças, a operação não conseguiu acabar com a corrupção no país.

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Representante da Transparência critica ausência de abordagem legal em votos na Câmara

 

“Essa fadiga pode também acontecer com a Lava Jato, embora seja mais difícil, tendo figuras como Renan Calheiros e Eduardo Cunha mantendo o assento na presidência do Poder Legislativo”, diz Brandão, em referência aos presidentes do Senado e da Câmara, respectivamente, ambos do PMDB e acusados por delatores da Lava Jato.

Para a ONG, a população precisa protestar contra o que vê como tentativas do Congresso Nacional de enfraquecer o combate à corrupção.

Seu representante cita uma série de projetos de lei em discussão, como os de número 233/2015 (que regulamenta procedimentos para abertura e encerramento de inquéritos civis públicos nos Ministérios Públicos Estaduais) e 2073/2015 (que proíbe o Ministério Público de realizar inquéritos policiais).

“A saída é manter a sociedade informada, engajada e vigilante, pois os que querem reagir contra a Lava Jato já estão se movendo para se preservarem e preservarem o status quo”, diz.

Na avaliação do especialista, o país precisa da criação de um sistema nacional anticorrupção, que seria responsável por coordenar os órgãos envolvidos na investigação e punição desse tipo de crime. Ele defende também a realização de uma ampla reforma política.

O Judiciário, diz ele, também precisa de aprimoramentos que tragam maior transparência, agilidade e eficiência na punição de envolvidos em esquemas de corrupção.

Votação do impeachment

Para a ONG, as acusações que pesam sobre parlamentares na Justiça e a falta de embasamento jurídico na argumentação dos deputados durante a votação que autorizou o início do processo de impeachment enfraquecem a legitimidade do Congresso para julgar a questão.

“O julgamento com base em aspectos legais não foi a condição predominante nos debates. Isso demonstra a falta de preocupação desses legisladores em apurar realmente contravenções à lei e a quebra do marco legal”, afirma Brandão.

De acordo com dados da ONG Transparência Brasil, mais de 50% dos parlamentares, em ambas as Casas, respondem a processos na Justiça.

Fonte: BBC