Em estudo inédito, ECA e Institute of Cultural Capital analisam o legado cultural dos Jogos Olímpicos Rio 2016

Segundo o professor Paulo Nassar, do Departamento de Relações Públicas, Publicidade e Propaganda (CRP), grandes eventos culturais são excelentes oportunidades para que os territórios possam estruturar as “narrativas de sua história, de seu povo e suas realizações” e o modo como eles se apresentam perante as demais comunidades do mundo. Em estudo sobre as narrativas de territórios desde o final dos anos 90, com foco no Brasil e no Rio de Janeiro, o professor afirma que estas narrativas são essenciais para que países e cidades possam “atrair capital financeiro, talentos e turistas”.

Aproveitando a oportunidade dos Jogos Olímpicos Rio 2016, que completaram um ano desde seu término em 5 de agosto, Nassar coordenou uma equipe de pesquisadores da ECA no estudo Impacto Cultural dos Jogos Olímpicos do Rio 2016, que analisou o impacto que as narrativas criadas pelo evento esportivo acerca do Brasil deixaram no imaginário popular daqui e do exterior.

O estudo é uma parceria entre o Grupo de Estudos de Novas Narrativas (GENN), coordenado por Nassar, o Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da ECA (PPGCOM), e o Institute of Cultural Capital, ligado à Universidade de Liverpool e à John Moores Liverpool University, e cuja coordenadora, pesquisadora Beatriz Garcia, é uma das maiores autoridades na análise do legado cultural de grandes eventos globais. Também contou com o apoio da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) e do Newton Fund, agência de fomento à pesquisa do governo britânico.

A pesquisa centrou-se no modo como os conteúdos trazidos pelas Olimpíadas “tinham presença nas publicações brasileiras e estrangeiras de grande visibilidade”. De acordo com Nassar, foram analisados cerca de 311 artigos publicados na mídia brasileira e 144 na imprensa britânica, em veículos como O Globo, a Folha de São Paulo, o Estado de São Paulo, o The Economist, o The Guardian, e o Financial Times, entre outros, todos os quais falavam de momentos-chave da trajetória do Rio de Janeiro enquanto sede dos Jogos Olímpicos, desde a escolha da cidade ao período após o encerramento do evento.

Nesse processo, os pesquisadores brasileiros e britânicos notaram que, do ponto de vista do legado cultural, as narrativas prometidas pelas Olímpiadas, não deixaram quase nenhum impacto no modo como o país costuma ser percebido, as chamadas “metanarrativas”, compostas geralmente pelos cinco S – Sound (som), SambaSoccer (futebol), Sand (areia) e Sun (sol) e pela violência e corrupção, conforme pontua Nassar.

O estudo revelou que o contexto sociopolítico do país pesou no modo como as Olimpíadas foram representadas nos meios de comunicação e assim, a realidade brasileira e seus efeitos no evento esportivo foram priorizados em detrimento das narrativas pretendidas pelos Jogos: categorias como as crises econômica e política e suas relações com o Rio 2016; a carência de uma política de Estado para a cultura; violência urbana; abandono das estruturas olímpicas; as dívidas milionárias deixadas pelo evento, e o apagamento da história da escravidão no projeto de reformulação da zona portuária do Rio se impuseram. “Em lugar de falarmos de esperança, de futuro, de expressar os nossos territórios em representações mais positivas, a gente teve toda uma narrativa voltada para o caos, para a divisão da sociedade e para todos os ressentimentos que a gente tem atravessado,” comenta o professor.

Ainda que tenham surgido algumas exceções nessa representação do país, como o Museu do Amanhã e a abertura dos Jogos, que foram metáforas de nossa criatividade e competência, os pesquisadores julgam que, nesse momento, “o Brasil perdeu a oportunidade de começar a colocar uma narrativa no mundo que faça uma promoção do nosso território em aspectos de nossa cultura, beleza natural e indústria”, conforme explica Nassar. “É muito importante estruturarmos uma narrativa brasileira à altura do nosso país e da criatividade do nosso povo,” revela. “Esses grandes eventos são vitrines das narrativas dos países e cidades e dificilmente nós vamos ter, nos próximos anos, uma plataforma tão forte de comunicar com o mundo as questões brasileiras”, revela.

Segundo Nassar, a abertura dos Jogos impressionou o mundo, mas não veio seguida “de uma política de Estado para a cultura e uma visão de que é por meio desta e da educação que vamos projetar um país melhor para o futuro”. Foto: The Mirror

Na próxima semana, os resultados do estudo serão apresentados em São Paulo, no dia 15 de agosto, na sede da Aberje e no Rio de Janeiro, no dia 17 de agosto, no Museu do Amanhã.

Texto: Victória Martins

Fonte: ECA – USP